O Brasil no Algarve

Hoje foi dia de encher o depósito de gasolina. Um gesto simples, rotineiro, sem nada de especial – ou assim pensei. Ao dirigir-me ao guichê para pagar, fui surpreendida pelo sorriso mais acolhedor que poderia imaginar. Um sorriso genuíno, aberto, daqueles que iluminam o dia de qualquer um. E, como se não bastasse, daquela boca sorridente saíram palavras tão afáveis, melódicas e empáticas que por instantes me senti transportada para outro lugar.

Aquela pronúncia envolvente, quente e ritmada, tão diferente do nosso tom mais contido, soou como uma brisa tropical no meio da minha rotina. Sim, estou a falar do sotaque brasileiro, esse canto doce que embala os ouvidos e nos acaricia os sentidos. Ultimamente, tenho notado que parece que moro no Brasil. Em quase todos os serviços a que me desloco, sou recebida por brasileiros. No ginásio que frequento, os diálogos em tom descontraído misturam-se num bailado de expressões típicas que, pouco a pouco, vão deixando a sua marca na sonoridade local.

Esta presença não é de agora. Lembro-me bem dos tempos em que fui professora. Metade da minha turma era constituída por alunos brasileiros – crianças que traziam consigo não apenas um sotaque diferente, mas também costumes, hábitos e paladares que enriqueciam a sala de aula. Recordo-me do fascínio das crianças portuguesas, que tentavam imitar aquela forma de falar tão musical e doce. Era curioso ver como absorviam expressões novas, como se divertiam com as diferenças e como, sem darem por isso, aproximavam-se de uma cultura que lhes era familiar através da televisão e das brincadeiras.

Mas nem todos se deixam envolver por este abraço cultural. O Algarve, apesar de ser uma terra de mar e sol, tem um povo que, em muitas situações, se mostra reservado, pouco expansivo e, por vezes, até desconfiado em relação a quem escolhe a região para viver. Há um certo receio do que vem de fora, uma resistência subtil que se esconde por trás de um "bom dia" mais seco ou de um olhar cauteloso. Talvez seja um traço do passado, uma forma de preservar o que lhes é familiar.

No entanto, o mundo está sempre em mudança, e o Algarve, com as suas paisagens de postal, há muito deixou de ser apenas dos algarvios. Hoje, é um mosaico de culturas, de sotaques e de histórias que se entrelaçam. E talvez seja essa a maior riqueza de todas: a possibilidade de aprendermos uns com os outros, de abrirmos espaço para novas formas de ver e viver a vida.

Afinal, um sorriso e uma palavra dita com doçura não têm nacionalidade. São simplesmente universais.



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