O Telemóvel: O Símbolo da Presença e da Ausência


 Olho para ele na palma da mão. Parece murmurar, convidando-me a aceder ao seu interior – a ler, a ver, a procurar. Lá dentro, encontro pedaços do meu mundo e do mundo dos outros. O telemóvel, tão simples na sua aparência, é muito mais do que metal e vidro. É uma porta para o "além", um elo que ultrapassa o tempo e o espaço. No seu brilho frio, enxergo o reflexo da humanidade: fragmentada, conectada, mas tantas vezes perdida.

É estranho sermos tão dependentes deste pequeno objeto. Que necessidade é esta de estarmos quase sempre agarrados ao telemóvel? Será porque ele guarda, em silêncio, vozes de quem está longe? Porque conserva memórias cristalizadas em fotografias ou segredos escondidos em mensagens nunca enviadas? Ele é, ao mesmo tempo, símbolo de intimidade e de distância. Aproxima o que está longe, mas afasta o que está perto.

Será que ele nos ajuda a combater a solidão? Será uma resposta aos medos e frustrações que ainda não superámos?

Se recuarmos no tempo, lembramo-nos de quando éramos crianças. Não tínhamos já essa necessidade de ter sempre connosco um objeto de conforto? A chupeta que não largávamos, a fraldinha que nos acariciava, o peluche com o qual dormíamos todas as noites – não seriam eles os equivalentes de hoje? Agora, o telemóvel cumpre um papel semelhante: uma companhia constante, um elo de ligação ao afeto, uma porta para as relações, uma promessa de acesso fácil ao que desejamos.

Talvez seja mais do que isso. Ele satisfaz a ânsia de conhecer o mundo, ainda que apenas virtualmente. Dá-nos a ilusão de presença e proximidade, mesmo quando estamos sós. Contudo, ao mesmo tempo, força-nos a questionar até que ponto a sua presença preenche ou esvazia.

Será este pequeno objeto apenas uma ferramenta ou um reflexo de quem somos? Uma extensão do nosso desejo de conexão e, paradoxalmente, do nosso medo de encarar o silêncio, a solidão e até nós mesmos?

Tal como o peluche ou a chupeta de outrora, o telemóvel simboliza as nossas fragilidades e necessidades mais profundas. Ele é o símbolo da busca incessante por algo que nos complete, mesmo que esse algo continue fora do nosso alcance.


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