Os passos do silêncio
Caminham na noite escura. Apenas os passos são audíveis. As candeias acompanham ritmicamente cada movimento, em perfeita sintonia. É difícil vislumbrar o caminho de terra batida. De vez em quando, sente-se uma pedra que salta após ser pisada. Passos cronometrados. Mas o que se ouve em cada um deles? É o silêncio que se faz sentir sobre os ombros, como um manto pesado que nos envolve. Pausas na conversa onde esse silêncio nos acolhe e intimida.
O céu nunca pareceu tão brilhante, repleto de incontáveis pontos de luz, mais numerosos do que aqueles que o meu céu habitual costuma revelar. Este céu é diferente: mais escuro, mais intenso, mais vivo.
E o que se conversa entre os momentos de silêncio? Fala-se do vizinho que partiu para trabalhar no estrangeiro, da vizinha que deu à luz, da desavença entre a Maria e o João. Conversa-se sobre as colheitas feitas, as amêndoas, os figos e as alfarrobas armazenadas na “casa do caminho” – um pequeno armazém assim chamado por ficar junto ao caminho de terra batida. Discute-se também o preço da arroba de cada fruto seco, a visita do negociante que virá na próxima semana pesar os frutos e fazer o pagamento correspondente. Espera-se fazer uma boa venda. Até o trigo já havia sido ceifado, e o macho – aquele animal forte, fruto do cruzamento entre um burro e uma égua – cumprira o seu papel, pisando o trigo para a debulha. Recorda-se ainda a história curiosa do bicho que invadiu a eira, furando o almeixar – os arbustos dispostos em redor das esteiras para proteger os figos que eram banhados pelo sol, enquanto este os secava com carinho.
Ao chegarmos ao destino, ao porto seguro da casa de família, esperava-nos uma fatia dourada e um café de cevada, um pequeno consolo antes de irmos dormir.
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