O peso do céu
Olhava distraído para o céu. Sentia que a imensidão que o cercava lhe oprimia o peito. Não sabia porquê. Era apenas mais um dia, igual a tantos outros, sem promessas de novidade. Mas uma sensação estranha, indefinível, entranhava-se-lhe nos poros, como se o ar estivesse mais denso, mais pesado.
Esfregou os olhos, numa tentativa vã de afastar aquela inquietação. Mas o céu continuava lá – amplo, imenso, inatingível. Encarava-o de volta, azul e indiferente, e ele sentia-se pequeno, um grão de poeira flutuando sem rumo. O que fazia ali? O que procurava?
As ruas começaram a despertar. As portas abriam-se, libertando habitantes apressados, envoltos na urgência das horas. O tilintar das chávenas no café da esquina, o arranque impaciente dos motores, o riso de uma criança a caminho da escola – tudo se misturava num caos harmonioso.
— Despacha-te, já estamos atrasados! — ouviu uma mãe gritar.
Um cão ladrava, tentando chamar a atenção do dono, que permanecia alheio. O tempo, sempre o tempo, corria sem piedade.
Ele observava tudo, mas sentia-se à parte, como se assistisse a um filme do qual já não fazia parte. Também queria estar nessa correria, na azáfama matinal, a ajeitar a mochila do filho, a ralhar-lhe por perder tempo com disparates. Também queria dizer “Despacha-te”.
Mas não podia.
O filho já não estava ali. Estava no céu.
O peito apertou-se-lhe ainda mais. O mesmo céu que o oprimia era agora a morada do seu menino. Respirou fundo, como se quisesse encher-se do ar que o separava dele. O peso da ausência esmagava-lhe os ombros, mas a vida lá fora não parava. Nunca parava.
Agarrou o maço de cigarros no bolso, hesitou. Antigamente, prometera ao filho que deixaria de fumar. "Faz mal, pai", dizia-lhe com aquela seriedade infantil que o fazia rir. Apertou o maço na mão e atirou-o para o caixote do lixo mais próximo.
Talvez fosse assim que se começava a seguir em frente. Pequenos gestos, pequenas escolhas, um passo de cada vez.
Olhou mais uma vez para o céu. Pela primeira vez, não sentiu que o esmagava. Apenas o imaginou lá, entre as nuvens, a sorrir-lhe.
Então, meteu as mãos nos bolsos e começou a caminhar. O dia tinha começado
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